domingo, 26 de dezembro de 2010

Os Cinco Sentidos

Logo na abertura de “Os Cinco Sentidos” visualizamos uma imagem difusa que, aos poucos, vamos entendendo do que se trata. Uma mulher, que a câmera mostra com a cabeça imersa na água, como que aproveitando aquela sensação de conforto e de meditação, aproveitando cada momento que vai se passando diante dos ponteiros do relógio.

Seria uma representação fílmica do ventre materno, evidenciando, posteriormente, a impressão de que os personagens estivessem no escuro e só a partir do nascimento, que poderia ser representado pela nitidez da imagem, passassem a ter a noção exata do que é "sentir" e que essa busca pelas sensações fosse o norte das suas vidas.
Essa cena é observada por uma criança que, mais tarde, terá papel fundamental nessa história e onde os tipos escolhidos e suas narrativas terão ligação direta com o tema principal: os sentidos e nossa percepção deles, em relação ao mundo.

E é essa a temática principal de um filme que não tem aquela preocupação do cinema comercial em mostrar personagens padrões em cenas vendáveis ou com o êxito da sua bilheteria. “Os Cinco Sentidos” é uma experiência lenta, que nos dá tempo para conhecer aquelas pessoas e que aproveita as variáveis oferecidas pela linguagem cinematográfica de forma a provocar um deleite visual e intelectual no expectador, meio que impulsionando os sentidos.

Para tanto, o diretor nos permite uma apreciação cheia de detalhes onde a câmara passeia pelos cenários e pelos elementos de cena com cuidado e dedicação. O objetivo é óbvio: dar ao público a chance de perceber o que está a sua volta sem a urgência dos tempos modernos. Nem sempre temos essa oportunidade, visto que, os filmes atuais, em especial, os que visam o lucro preferem optar pelas sensações instantâneas e esquecimento posterior ao acender das luzes da sala de cinema.

Não há, por aqui, o impacto do cinema de franquia e aquela sensação de segurança oferecida pela indústria cultural onde, segundo Zygmunt Bauman, "as pessoas não estão apenas, como diz o ditado, caindo numa farsa... elas querem ser enganadas, sentem que suas vidas seriam totalmente intoleráveis tão logo deixassem de se apegar a satisfações que nada significam".

A tônica que se destaca nessas histórias é a do sentimento do indivíduo que procura acompanhar o movimento dos nossos tempos, como se o próprio estivesse deslocado de uma realidade imposta por essa obsessão pela urgência. Uma esperança que parece perdida, entre os personagens de “Os Cinco Sentidos”, que nos passam essa insatisfação nessa busca incansável pelos sentidos.

“Tornar as coisas diferentes, mantê-las em movimento, é o que realmente conta: são a mudança e mais ainda a confiança e a decisão de que as coisas podem ser mudadas que mantêm viva a esperança da satisfação”, afirma Bauman. 

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